domingo, 24 de janeiro de 2010

Onirogrito






Antroponímico


Brontops. Se um dia eu tivesse uma banda de punk rock, ela se chamaria Brontops. A capa de seu primeiro disco seria formada por um triângulo e dois trapézios de tal forma que juntos sugerissem a letra Y. O baixista raparia o cabelo e teria o corpo coberto de tatuagens de escorpiões. Apenas escorpiões. Não lembro mais como seriam os outros dois integrantes. O nome do filho de Alejandro Jodorowsky é Brontis. Atuou nu em El Topo. No início do filme, o pai o instrui a enterrar seus brinquedos e um retrato da mãe. Brontofobia é pavor fóbico de trovão. Brontossauro é um animal que só existiu por engano, uma confusão na hora de montar os ossos de um fóssil. Marmaduke Bonthrop Shelmerdine é o nome do marido de Orlando, de Virginia Woolf. Da mesma forma que Orlando era um homem que um dia desperta mulher, Shelmerdine fora uma mulher que quisera se transformar em homem. Bonthrops especifica o gênero no nome científico das jararacas e urutus. A partir do veneno da jararaca fizeram o remédio captopril. Minha mãe precisa tomar todo dia.


Brontops Robustus é um rinoceronte pré-histórico com chifre em forma de Y. Eles estiveram presentes na Era do Gelo 1. Da mesma linhagem do Brontops Robustus teriam surgido antas, cavalos e rinocerontes. Os rinocerontes são animais muito míopes. Existiu certa confusão entre o rinoceronte e o unicórnio. Marco Polo se desapontou ao constatar tão pouco gracioso era o unicórnio, robusto, de patas grossas, mais próximo de um boi ou de um porco do que de um eqüino ou de uma gazela. Em 1515, o rei de Portugal recebeu um rinoceronte de presente de um rajá indiano. O animal era acostumado ao cativeiro. A espécie não era vista na Europa desde os tempos do Império Romano, onde enfrentaram outras criaturas ou humanos em duelos sob a ovação do público. Surgiam na arena de combate através de um alçapão, onde arremetiam seus corpos e chifres contra seus adversários, uma palavra demasiado humana para fazer sentido a um animal. Mas aparentemente não foi para seguir a tradição de rinha que o rinoceronte fora colocado para duelar com um elefante também pertencente à coleção real de animais exóticos. Segundo consta, o rei queria colocar à prova a afirmação de Plínio, o Velho, segundo a qual rinocerontes e elefantes seriam inimigos mortais, quase tanto quanto grifos e cavalos. Os grifos eram criaturas aladas, metade leão, metade águia, que segundo a lenda alimentavam-se de cavalos. O conceito de hipogrifo encerrava a dialética dos opostos hoje mais reconhecida no Ying Yang, símbolo que também foi roubado pelo PCC (Por sua vez, o hipogrifo foi domado por Harry Potter). Segundo as crônicas da época, o rinoceronte avançou contra o jovem elefante indiano, Aparentemente assustado com a presença barulhenta do público na arena de touros, o elefante fugiu antes que houvesse uma única cena de combate para desapontamento dos pagantes. Diz o texto sob a gravura de Dürer: “No dia 1º de maio de 1513 foi trazido da India para Lisboa, como oferta para o grande e poderoso rei Manuel de Portugal, um animal vivo chamado rinoceronte. Sua forma é aqui representada. Ele tem a cor de uma tartaruga salpicada e é coberto por grossas escamas. É semelhante a um elefante em tamanho, mas de pernas mais curtas e é quase invunerável. Tem um forte e afiado chifre sobre o seu nariz, que ele afia nas pedras. O estúpido animal é, do elefante, o inimigo mortal. O elefante tem muito medo dele pois, quando se encontram, o rinoceronte corre com a cabeça abaixada entre as pernas dianteiras do animal e rasga-lhe o estômago com seu chifre, estrangulando-o, de modo que o elefante não pode se defender. Por ser este animal tão bem armado, não há o que o elefante possa fazer contra ele. É também dito que o rinoceronte é rápido, impetuoso e astuto."
Um crítico afirmou que “uma criatura assim não poderia ser estúpida e astuta ao mesmo tempo”. Dürer teria respondido, “bem se vê que não conheces a própria espécie”. O rei decidiu enviar o rinoceronte ao Papa, precisava de seus favores para resolver questões quanto às rotas comerciais de especiarias, e o embarcou em um navio para Roma. Um naufrágio na costa da Ligúria acabou por encerrar a jornada do rinoceronte. Mas não a de seu corpo. A carcaça do animal foi retirada da água (como?), empalhada e enviada a Roma. Dürer nunca viu o animal vivo nem morto: teria feito sua xilogravura a partir de um esboço feito em uma carta enviada pelo gravurista e tipógrafo Valentim Fernandes. O rinoceronte não possui placas córneas como couraças, nem de longe se assemelha a um animal com uma armadura. O pouco conhecido pangolim africano se aproxima mais desta ideia, embora seu aspecto sinuoso não transmita a força que se supõe irmã da invencibilidade da armadura. Há quem sugira que o esboço de Fernandes tivesse sido do animal vestido com uma armadura de batalha, com o bicho pronto para enfrentar o elefante. Existe quem afirme que as marcas sobre o couro do animal seriam de uma dermatite provocada durante a viagem de quatro meses dentro de um navio até Portugal. Outros ainda supõem que a base de Dürer foi o animal empalhado, nas técnicas precárias do século XVI, com o couro ressecado, rachado, fragmentado e coberto de cracas e animais marinhos. Uma outra gravura feita por Hans Burgkmaier era mais fidedigna à criatura, mas jamais foi tão popular quanto a de Dürer. Enquanto resta uma única cópia da gravura de Burgkmaier, a base de madeira de Dürer foi usada tantas e tantas vezes que sinais de cupins começaram a marcar as gravuras. A ideia do rinoceronte como um animal de armadura persistiu até dar origem a Tundro, o rinoceronte alienígena de estimação dos Herculóides. Encontra-se no livro O Último Round de Cortazar um desenho de Jean-Michel Folon de um alegre e interrompido rinoceronte-centopéia. Se completarmos a figura com outras patas, torcermos o sorrisinho em uma expressão ranzinza e quebrarmos a ponta de seu chifre chegaremos ao Tundro da TV. Os rinocerontes são extremamente territorialistas. Em um filme sobre a África, o chifre do rinoceronte atravessa a porta zebrada de um jipe. No YouTube, você pode encontrar algumas filmagens com embates entre rinocerontes e elefantes. O Y é a letra mais feminina do alfabeto: lembra uma vulva. O Y é o cromossomo que determina o macho. Ninguém gosta deste nome. Mas ele continua.










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