terça-feira, 24 de dezembro de 2013
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segunda-feira, 16 de dezembro de 2013
Telegramas
A honra cria as artes
Eu tenho por bem que coisas tão assinaladas, e porventura nunca ouvidas nem vistas, cheguem ao conhecimento de muitos e não se enterrem na sepultura do esquecimento, pois pode ser que alguém que as leia nelas encontre algo que lhe agrade, e àqueles que não se aprofundarem muito, que os deleite. A esse propósito diz Plínio que não há livro, por pior que seja, que não tenha alguma coisa boa. Principalmente porque os gostos são variados e o que um não come, os outros se matam por comer. Assim vemos coisas que, menosprezadas por alguns, por outros não o são. Por isso, nenhuma coisa deveria ser destruída ou desprezada, a menos que fosse muito detestável; antes, que chegasse ao conhecimento de todos, principalmente sendo sem prejuízo e podendo-se dela tirar algum proveito. Porque, se assim não fosse, muito poucos escreveriam para um só, pois isso não se faz sem trabalho, e, já que o têm, querem ser recompensados, não com dinheiro, mas com que vejam e leiam suas obras e, se forem merecedoras, que sejam elogiadas. A esse propósito, diz Túlio: “A honra cria as artes”.
Pensará alguém que o soldado, que é o primeiro na escala, tem a vida mais maçante? É certo que não; mas o desejo de ser louvado o faz lançar-se ao perigo. Nas artes e nas letras acontece a mesma coisa. Predica muito bem o prelado e é homem que deseja ardentemente o proveito das almas, mas perguntem a sua mercê se lhe pesa quando lhe dizem: “Oh, quão maravilhosamente pregou Vossa Reverência!”. Lutou muito mal o senhor dom Fulano e deu o gibão da batalha ao truão porque este o louvava por ter dado muito boas lançadas. Que teria feito, se fosse verdade?
E tanto vai a coisa dessa forma, que, confessando que não sou mais santo que meus vizinhos, desta nonada, que neste grosseiro estilo escrevo, que não me pesa que tomem parte e com isto se divirtam aqueles que nela algum prazer encontrarem, e vejam como vive um homem com tantas desgraças, perigos e adversidades.
"Prólogo" de Lazarilho de Tormes, autor anônimo, 1554.
Imagem: La Fabula, de El Greco.
Eu tenho por bem que coisas tão assinaladas, e porventura nunca ouvidas nem vistas, cheguem ao conhecimento de muitos e não se enterrem na sepultura do esquecimento, pois pode ser que alguém que as leia nelas encontre algo que lhe agrade, e àqueles que não se aprofundarem muito, que os deleite. A esse propósito diz Plínio que não há livro, por pior que seja, que não tenha alguma coisa boa. Principalmente porque os gostos são variados e o que um não come, os outros se matam por comer. Assim vemos coisas que, menosprezadas por alguns, por outros não o são. Por isso, nenhuma coisa deveria ser destruída ou desprezada, a menos que fosse muito detestável; antes, que chegasse ao conhecimento de todos, principalmente sendo sem prejuízo e podendo-se dela tirar algum proveito. Porque, se assim não fosse, muito poucos escreveriam para um só, pois isso não se faz sem trabalho, e, já que o têm, querem ser recompensados, não com dinheiro, mas com que vejam e leiam suas obras e, se forem merecedoras, que sejam elogiadas. A esse propósito, diz Túlio: “A honra cria as artes”.
Pensará alguém que o soldado, que é o primeiro na escala, tem a vida mais maçante? É certo que não; mas o desejo de ser louvado o faz lançar-se ao perigo. Nas artes e nas letras acontece a mesma coisa. Predica muito bem o prelado e é homem que deseja ardentemente o proveito das almas, mas perguntem a sua mercê se lhe pesa quando lhe dizem: “Oh, quão maravilhosamente pregou Vossa Reverência!”. Lutou muito mal o senhor dom Fulano e deu o gibão da batalha ao truão porque este o louvava por ter dado muito boas lançadas. Que teria feito, se fosse verdade?
E tanto vai a coisa dessa forma, que, confessando que não sou mais santo que meus vizinhos, desta nonada, que neste grosseiro estilo escrevo, que não me pesa que tomem parte e com isto se divirtam aqueles que nela algum prazer encontrarem, e vejam como vive um homem com tantas desgraças, perigos e adversidades.
"Prólogo" de Lazarilho de Tormes, autor anônimo, 1554.
Imagem: La Fabula, de El Greco.
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segunda-feira, 2 de dezembro de 2013
Telegramas
"Pode-se dizer que a vida adulta é definida por duas grandes histórias de amor. A primeira - a da busca por amor sexual - é bem conhecida e bem representada, suas peculiaridades formam a matéria-prima da música e da literatura, ela é socialmente aceita e celebrada. A segunda - a história da nossa busca do amor do mundo - é mais secreta e infame. Se mencionada, tende a ser em termos cáusticos, debochados, como algo que interessa principalmente a almas invejosas ou imperfeitas, ou então o impulso por status é interpretado somente no sentido econômico. No entanto, a segunda história do amor não é menos intensa que a primeira nem menos complicada, importante ou universal, e seus reveses não são menos dolorosos. Aqui também há desilusão, sugerida pelos olhares distantes e resignados de muitos daqueles que o mundo elegeu para desprezar por serem ninguém"
Alain de Botton, Desejo de Status.
(Foto via Rich Kids of Instagram)
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segunda-feira, 18 de novembro de 2013
Telegramas
"
Que leitura você faz do que se passa na literatura contemporânea?
Não creio que seja possível fazer tal leitura, mas acredito que há mais desconfiança que nunca na ficção. Creio que a sociedade contemporânea deixou de confiar na ficção como uma maneira única e insubstituível de explorar nosso mundo e nossa condição humana. Creio que os modos de pensamento que a ficção propõe - modos ambíguos, baseados no teimoso questionamento de nossa realidade, na vontade de explorar nossos lados mais obscuros sem fechar os olhos - não são muito populares no presente. A ficção que não se resigna a apaziguar o leitor, mas inquietá-lo, que se nega a enganá-lo e busca, ao contrário, dizer as verdades mais dolorosas, essa ficção está desaparecendo porque já não interessa à grande massa dos leitores, cuja consciência foi sequestrada pelo conformismo e pela frivolidade. Nada que, obviamente, seja uma razão para não continuar a escrever. "
Entrevista de Juan Gabriel Vásquez, publicada no Estadão
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segunda-feira, 11 de novembro de 2013
Telegramas
O escritor precisa ser um ursinho carinhoso.
"No ensaio “Why I Write”, de George Orwell, o pensador britânico reflete sobre os motivos que levam alguém a escrever um livro. O primeiro item da lista choca os mais idealistas: “puro egoísmo”. Orwell explica o que quis dizer com isso: “O desejo de parecer inteligente, de que outras pessoas falem de você (…)”. Os outros três motivos para escrever, de acordo com Orwell, são: “entusiasmo estético”, “impulso histórico” e “motivação política”. Cada uma destas motivações está presente, nas mais variadas proporções, em todos os escritores – e, como sugere Murphy, talvez também nos leitores. No final, faz diferença o que motivou Orwell a escrever 1984? E se lêssemos uma entrevista no qual ele revelasse ter redigido a obra por pura vaidade? Isso mancharia a imagem do autor? O escritor precisa ser um ursinho carinhoso? O fato é que Orwell escreveu 1984 e que James Murphy compôs Losing My Edge, provavelmente movido por pretensão e por uma leitura que fez por vaidade. E somos gratos ao egoísmo deles."
Finalzinho da postagem de Xerxenesky no blog da Cosac sobre os motivos fúteis e egocêntricos que levam alguém a escrever.
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sábado, 9 de novembro de 2013
Achados
O avô de Sherlock Holmes acreditava em fadas
a)Charles Altamont Doyle (1832-1893), pai de Arthur Conan Doyle (o criador de Sherlock Holmes), foi pintor de pouca relevância. Foi alcoólatra e sofria de depressão. Dentre seus temas prediletos, cenários com fadas (com o tempo, tornaram-se mais sinistros). O quadro acima, A Dance around the Moon, me lembrou Charles Vess. Via Victorian Era Fan Guide (que entre outras coisas tem o programa da primeira peça de teatro baseada em Drácula de Bram Stoker em 1897)
b)Sharon Tate - Via Ffactory.
c)Destroy comics, tumbrl de um fã do quadrinista Paul Pope.
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sábado, 2 de novembro de 2013
Telegramas
“Parecia um claro dia de primavera. O sol brilhava nos loureiros que ladeavam o caminho do jardim por onde irmã Inez passeava, agarrada a seu breviário. Até ela chegar à fonte, as saias negras compridas esconderam o fato de que estava descalça. Era o tipo de jardim em que se esperaria que o ar estivesse pesado com o cheiro doce do jasmim, e embora os pássaros não aparecessem dava para imaginá-los cantando e roçando as asas com nervoso prazer à sombra dos arbustos. A irmã Inez estendeu um pé brilhante e tocou a água do tanque; o céu cintilava alvo. Dos arbustos, padre José observava, os olhos brilhantes ao acompanharem os pezinhos seguindo um depois do outro pela água transparente. De repente, a irmã Inez soltou o capelo que estava preso por um colchete debaixo do queixo; as madeixas negras rolaram pelos ombros. Com um segundo gesto brusco ela soltou o hábito até embaixo (era incrivelmente fácil), abriu bem e virou para revelar o jovem corpo branco e roliço. Um momento depois ela jogara as roupas em cima de um banco de mármore e estava parada ali, completamente nua, ainda segurando o livrinho preto e o rosário. Os olhos de padre José se abriram ainda mais, e ele voltou o olhar para o céu: estava rezando para pedir forças para resistir a tentação. Na verdade, as palavras PIDIENDO EL AMPARO DIVINO apareceram gravadas no céu e lá ficaram, tremulando ligeiramente, durante vários segundos. O que se seguiu não era uma surpresa para Dyar, uma vez que ele não esperava que viesse o amparo divino, nem se surpreendeu quando, um momento depois, três outras freiras saudáveis entraram de outras tantas direções para se juntar ao ocupado casal na fonte, transformando assim o pas de deux em um número coral.”
Que venha a tempestade, Paul Bowles (1952)
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sábado, 12 de outubro de 2013
Telegramas
Escalas
I was continuing to shrink, to become... what? The infinitesimal? What was I? Still a human being? Or was I the man of the future? If there were other bursts of radiation, other clouds drifting across seas and continents, would other beings follow me into this vast new world? So close — the infinitesimal and the infinite. But suddenly, I knew they were really the two ends of the same concept. The unbelievably small and the unbelievably vast eventually meet — like the closing of a gigantic circle. I looked up, as if somehow I would grasp the heavens. The universe, worlds beyond number, God’s silver tapestry spread across the night. And in that moment, I knew the answer to the riddle of the infinite. I had thought in terms of man’s own limited dimension. I had presumed upon nature. That existence begins and ends in man’s conception, not nature’s. And I felt my body dwindling, melting, becoming nothing. My fears melted away. And in their place came acceptance. All this vast majesty of creation, it had to mean something. And then I meant something, too. Yes, smaller than the smallest, I meant something, too. To God, there is no zero. I still exist!
From Jack Arnold’s The Incredible Shrinking Man
(Via "But does it float")
b)O artista holandês Arne Hendriks iniciou um projeto para promover a ideia da redução de tamanho da espécie humana, reduzindo-a a cinquenta centímetros. O caso está relatado AQUI, no Second Sight e o blog do projeto é ESTE.
(foto: Paisagens de contos-de-fada por Magdalena Bors. Via.)
I was continuing to shrink, to become... what? The infinitesimal? What was I? Still a human being? Or was I the man of the future? If there were other bursts of radiation, other clouds drifting across seas and continents, would other beings follow me into this vast new world? So close — the infinitesimal and the infinite. But suddenly, I knew they were really the two ends of the same concept. The unbelievably small and the unbelievably vast eventually meet — like the closing of a gigantic circle. I looked up, as if somehow I would grasp the heavens. The universe, worlds beyond number, God’s silver tapestry spread across the night. And in that moment, I knew the answer to the riddle of the infinite. I had thought in terms of man’s own limited dimension. I had presumed upon nature. That existence begins and ends in man’s conception, not nature’s. And I felt my body dwindling, melting, becoming nothing. My fears melted away. And in their place came acceptance. All this vast majesty of creation, it had to mean something. And then I meant something, too. Yes, smaller than the smallest, I meant something, too. To God, there is no zero. I still exist!
From Jack Arnold’s The Incredible Shrinking Man
(Via "But does it float")
b)O artista holandês Arne Hendriks iniciou um projeto para promover a ideia da redução de tamanho da espécie humana, reduzindo-a a cinquenta centímetros. O caso está relatado AQUI, no Second Sight e o blog do projeto é ESTE.
(foto: Paisagens de contos-de-fada por Magdalena Bors. Via.)
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sexta-feira, 11 de outubro de 2013
Telegramas
a)
Até a tolice é perigosa nas mãos de um tolo.
O Mago de Terramar, Crônicas de Terramar, Ursula Le Guin.
b)
Uma horda ávida por tagarelar sem ponderação alguma, emitindo opiniões compulsivas sobre qualquer coisa como se esse desespero servisse para confirmar sua existência.
Digam a Satã que o recado foi recebido, Daniel Pellizzari.
(voltei, mas em ritmo de aranha na teia.)
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sábado, 18 de maio de 2013
Onirogrito
Ando meio sem paciência.
Faz muito tempo que não coloco nada aqui.
A verdade é que a onda já não passa mais pelos blogues. Boa parte do conteúdo (links para outros links) migrou para o Facebook e, apesar do que andam dizendo, ele ainda se sustenta. Não por força própria, eu creio, mas simplesmente por não ter aparecido outro "lugar".
E não sei se este lugar irá "aparecer" tão cedo, pois agora todos já perceberam que ele também irá nascer, crescer, tornar-se imenso, desmoronar sob seu próprio peso e morrer. Além do mais, a rede parece ter se tornado um lugar mais para se comunicar (entre amigos, paqueras, arrumar trabalho) do que para gerar conteúdo.
E, cá entre nós, até mesmo o conteúdo anda chato. Tanta gente falando e fazendo barulho que é difícil encontrar um ponto de vista original, que faça você pensar... É muito mais uma questão de concordar... ou discordar...
Mas isto não é um adeus. Volto aqui qualquer dia desses. "O olho do dono engorda o boi" Já ouviu falar?
Nos comentários, deixarei um email para quem quiser se comunicar.
Obrigado
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sábado, 2 de fevereiro de 2013
Onirogrito
Jogo do Velho
Dentre as penalidades cabíveis ao pai
moderno está a de frequentar aniversários em buffets infantis. Perguntar
ao menino se não quer ir antes ao banheiro, tirar foto, entupir-se de
coxinhas, passear de carrossel, almoçar massa sujeita a alternativas
binárias (bolonhesa ou molho branco), conversar com os pais sobre as
doenças dos filhos, sobre as amizades dos filhos, sobre os times que os
filhos deverão torcer, tomar coca quente fugindo assim do chope quente,
entupir-se de empadinhas, arrastá-lo para o banheiro (o guri escapa por
entre os dedos, sem mijar), tirar foto, tentar alimentar o moleque
enquanto corre, pegar trenzinho, verificar fralda, rastejar no
brinquedão para resgatar criança empacada, levar canelada, gravar vídeo,
enfiar-se na piscina de bolinhas atrás do celular perdido, estimular o
medroso a escorregar por um intestino plástico de cinco metros de
altura, separar brigas na fila do pula-pula, tirar foto, observar as
calças do filho (Você fez xixi? Mas eu não perguntei pra você?).
Chega um momento que a gente aprende a
relaxar, e passa a se divertir. As crianças envelhecem e você pode
afrouxar a atenção. Deixe-as poraí. Existem outras coisas além de calor e
barulho. Veja as monitoras adolescentes com o brilho da idade nova, o
viço necessário para estimular seus vícios. Mães divorciadas com quem
repartir um chope quente. Subornar (mediante uma nota de cinquenta ou
por pura simpatia) o garçom para
que ele sirva sua mesa antes.
Alguns buffets possuem brinquedos
adultos. Nada tão pesado quanto o que passou pela sua cabeça. Uma
televisão com a programação de esportes. Talvez, mesas de bilhar,
pebolins. Dardos são perigosos. O normal é a diversão voltada aos
adolescentes acabe sobrando aos adultos. Inclusive as máquinas de
fliperama. Estes locais tornaram-se um dos últmos nichos para estes
jogos. Os antigos paraísos de office-boys foram extintos das ruas.
Nestas festas, entretanto, é normal ver adultos saudosos disputando
lugar para comandar naves espaciais, bater uma bola ou tirar um racha.
* * *
Em um final de semana qualquer, fomos
para uma destas festas. Não era um buffet luxuoso, nada de montanhas
russas ou pistas de autorama. Contudo, a comida era boa, salgadinho seco
no ponto certo. Além disso, houve a inteligência de separar adultos e
pirralhos do convívio. Foi bom, possível até conversar sem gritar. O
lugar era simples, depois ficamos sabendo que o imóvel fora vendido e
daria lugar a outro destes megaultra-empreendimentos imobiliários
residenciais. Isto explicava algum descuido com os brinquedos. Carrinhos
de bate-bate já não batiam. Plástico remendado com fita adesiva.
Máquinas de fliperama quebradas, apenas uma em funcionamento.
A Máquina tinha uma tela menu na qual
seria possível escolher um entre mil jogos, quase todos muito antigos,
telas de fundo preto. Asteroids, Frogger, Enduro, Shinobi, River Raid,
Green Beret, Galaca, Pitfall, Double Dragon e demais artefatos
arqueo-tecno-lógicos. Exemplares pixelados que, se não fosse a
capacidade alephiana da Internet de agrupar reunir a eternidade, espaço e
tempo, em um único ponto, certamente só existiriam nas nossas memórias.
Mas ali estavam estas preciosidades históricas nas mãos inábeis de
pimpolhos incapazes de usar até um giz de cera.
Bem que gostaria de ter experimentado um
pouco destes jogos. Mas os meninos acostumados a ver filmes 3D, a
coreografar em Kinect, crianças que deveriam se encantar com as figuras
perfeitas de Final Fantasy e não com aqueles tangrans mal feitos. Digo
isto com raiva, pois eu não queria ficar na fila junto com aqueles
pirralhos e esperava uma oportunidade que não surgia. Os garotos (eram
quase sempre meninos) tentavam um jogo, perdiam as três vidas de praxe e
voltavam para a tela de menu, trocando de jogo. Ninguém insistia.
Experimentavam, se não funcionava imediatamente, zapeavam para outro
jogo. Havia uma rotatividade constante diante da máquina.
Dentre as penalidades sugeridas ao pai
moderno, está a de procurar oferecer o máximo de oportunidades possível a
seus filhos, como se apenas a liberdade permitisse a melhor
alternativa. Mas não. Ao ver aqueles garotos trocando constantemente de
jogos, sem se concentrar em nenhum, sofrendo derrota após derrota,
pensei que mais que abrir horizontes devêssemos indicar direções para se
guiar. Mesmo que você se encontre tão perdido quanto ele.
Quando finalmente consegui jogar, me vi fazendo exatamente o mesmo que as crianças.
(Original AQUI; desculpem este blog anda preguiçoso; Falando em games antigos, foi notícia recente: a Atari pediu falência.)
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terça-feira, 8 de janeiro de 2013
Telegrama
One perfect sunrise
orbital
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sábado, 5 de janeiro de 2013
Onirogrito
Uma afirmação negativa do método
Bom… foi mais difícil que esperava falar de meus métodos de criação. Conheço alguns e pesquiso constantemente a respeito do processo criatívo. É um vício. Muito do
que vou dizer já foi dito, portanto. Mas, na realidade, eu não sei se
posso afirmar positivamente (¿Existe “afirmar negativamente”?) “Tenho um
método e ele é x”. Sou muito intuitivo. Me esforço para continuar
sendo. Não sei se vale a pena repartir este esboço de metodologia. Pelo
pouco que conheço das pessoas, elas são muito diferentes para existir
uma receita geral.
Toda a regra (não apenas as fórmulas
mágicas da criatividade) devem ser observadas com parcimônia. O contexto
do próprio autor e da obra, aquilo que se deseja dizer e não-dizer,
tudo isto não se ensina. Aprende-se, desaprende-se, apreende-se sozinho.
Bem que tentei me organizar, separar em
tópicos, fazer alíneas e parágrafos, mas não conseguia botar tudo em uma
hierarquia ou ajeitar didaticamente. A exemplo de Jodorowsky ou de um
mendigo verborrágico, preferi emendar frase em frase, como provérbios,
ordens, mandamentos, gritos de guerra, sem ordem. Seja crítico e
criterioso e veja o que serve e o que não serve para você.
Divirta-se. Entre um cenário verossímil e
um personagem verdadeiro, prefira sempre os personagens. Se possível,
bole a conclusão antes; se não, aproveite a viagem e o leitor a
aproveitará com você. Não tenha medo ou vergonha de errar. Divirta-se
com o que está fazendo, mesmo que seja horrível. Abstrações emocionais
funcionam melhor que as concretas. Apaixone-se por estranhos e escreva
antes que aconteça. Se acontecer, não tente escrever. Surpreenda-se.
Pesquise 300%, mas use 10%. Seja aberto: leia Dom Quixote e assista a A
Hora da Aventura. Divirta-se. Leia (ou assista) de tudo, seja
compreensivo com o mundo. Pergunte-se porque é assim. Cuidado com
qualquer fórmula: Jornada do Herói, Morfologia de Propp, Manual de Syd
Fields, Situações de Polti, Gramática de Rodari, inclusive aquelas que
você mesmo inventar. Evite (ou recuse-se) a petrificar teorias.
Surpreenda-se. Seja verdadeiro. Divirta-se. Anote as sincronicidades.
Não faça charadas. Acredite no que está fazendo. Acredite até naquilo
que duvida. Pesquise as brincadeiras das crianças. Escute as pessoas
conversando. Observe, seja o fotógrafo secreto do mundo. Explore.
Divirta-se.
Por último, creio que isto seja o mais
importante (Hoje, pelo menos; amanhã posso acreditar em outra coisa),
algo que li folheando um livro: Conhecer-se e escolher o “seu” próprio
estilo de criação.
“Certa vez, perguntei ao artista gráfico
Saul Steinberg “Por que será que não consigo conversar com alguns
escritores? Não encontro assunto: por que parece que estou falando com
pediatras ou corretores de imóveis e não escritores? Ele pensou e
respondeu: “Isto é fácil: existem dois tipos de artistas, nenhum deles
superior ao outro; um responde à própria vida e o outro responde à
história da arte até aquele momento.” (Kurt Vonnegut, em leitura ao
acaso na livraria)
(Publicado originalmente AQUI, no Universo Insônia. Imagem do livro Como a Mente Funciona, de Steven Pinker veio DAQUI)
(Publicado originalmente AQUI, no Universo Insônia. Imagem do livro Como a Mente Funciona, de Steven Pinker veio DAQUI)
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