domingo, 2 de agosto de 2015

Onirogrito


A gente não quer só comida




1.O trecho sobre alimentação em um antigo Guia Lonely Planet sobre o Brasil dizia – mais ou menos – o seguinte: Se o turista gostar de prato cheio (pense nos churrascos, no P.F., no comercial) não terá problema, mas ele não verá muita variação além do feijão-arroz-salada-mistura. Um pouco burro, como toda generalização. Mas não deixa de ter lá sua verdade.

2. De uns tempos para cá, parece que viramos franceses, dada a quantidade de programas culinários e gastronômicos. Porém, para o dia-a-dia, continuamos sem muito tempo de ficar na cozinha. Embora ir ao restaurante ainda seja um programa, fazer comida, ou melhor, fazer “gastronomia” não se tornou ainda um programa de lazer, ou para fazer entre amigos.

(ou - pelo menos - entre meus amigos, que ainda preferem ir ao bar)

3.Assisti a “A Fantástica Fábrica de Chocolate” com o Gene Wilder. Mas acho que incluíram a cena na refilmagem com Johnny Deep. O Sr. Wonka criou o “Wonkavisão”, no qual um chocolate gigante é “televisionado” para um aparelho e se consubstancia em um chocolate normal, que pode ser devorado pelos espectadores. Um comercial de TV que entrega o produto.  Pronto para ser devorado.

4.A tecnologia ainda está um pouco longe de fazer isso. Mas para todo o resto parece que já está assim. Desde sapatos até cocaína, desde perfumes até badulaques da 25 de março, tudo pode ser comercializado pela internet. Não sei como as coisas andam em sua cidade (ou em seu bairro, já que essas coisas variam bastante), mas nas minhas redondezas, poucos comércios conseguem sobreviver muito tempo.
Exceto os que se relacionam com atividades que não podem ser “virtualizadas”: por exemplo, comida.

5. Queimamos uma floresta de atividades econômicas e a substituímos por pasto.

6. Em um dos filmes surrealistas de Buñuel, há a cena famosa do jantar elegante. Pessoas chiques sentam-se ao redor de uma mesa. Todavia, ao invés de cadeiras, temos vasos sanitários. Quando um convidado sente fome, ele se dirige ao banheiro, onde em uma mesinha frugal, em um ambiente escuro e espartano, ele pode fazer sua refeição solitariamente.


7. Como se não bastassem as regras de etiqueta, temos as de saúde: evitar açúcar, carboidratos, gorduras, colesterol, lactose, glúten. Além delas, há as de consciência ambiental: comida orgânica, vegetal, veganismo. Se eu estivesse a fim de pesquisar, encontraria outras formas diferentes: comer no escuro, meditando, comer em pé, em divãs. Comer é básico. O resto é que não é.