Você é um adulto?
Depois
tudo ficou calmo. Danny achou que estava sozinho, mas, quando virou a cabeça,
lá estava o filho de Howard, Benjy, na cadeira em que Howard estivera sentado.
A criança estava de pijama de manga comprida, estampado com peixes vermelhos.
Seu cabelo escuro, emaranhado, como se tivesse acabado de acordar.
Benjy:
Doeu?
Danny
olhou para ele, esperando que os olhos se adaptassem à luz. O pijama do menino
o confundiu – eram peixes vermelhos grandes comendo os vermelhos menores ou
será que todos os peixes eram iguais?
Danny:
Doeu o quê? Cair da janela?
Benjy:
Não. A injeção.
Que
nada. Foi até bom.
Benjy
franziu a testa, como se não conseguisse saber se Danny estava brincando. Por
fim, disse: Na verdade, não me deixam subir no parapeito das janelas porque é
perigoso.
Vou
anotar isso.
Benjy:
Sua mãe já disse isso para você?
Provavelmente.
Agora
você vai ter que ir para casa?
Por que
eu iria para casa? Acabei de chegar.
Benjy:
Sua casa é um apartamento?
É. Quer
dizer, em geral, sim, mas neste momento eu não tenho casa. Estou numa fase de
transição.
Por que
diabo ele estava explicando tudo aquilo? Danny se revirou na cama, em busca de
alguém que o resgatasse daquele pirralho. Mas até onde podia ver, não tinha
mais ninguém no quarto. O vento soprava pela janela e balançava as tapeçarias
penduradas nas paredes de pedra.
Benjy: Você
tem uma esposa?
Não.
Minha
mãe é esposa de meu pai.
É, eu
percebi isso.
Você tem
um cachorro?
Não.
Você tem
um gato?
Não
tenho nenhum animal de estimação, ok?
Nem um
porquinho-da-índia?
Minha
nossa! Sua voz soou muito alta e Benjy pareceu assustado. Danny torceu para que
aquilo fizesse o garoto calar a boca.
Benjy: Você
tem filhos?
Danny
rangeu os dentes e cravou os olhos nas vigas do teto. Não, eu não tenho filho
nenhum. Graças a Deus.
O garoto
ficou calado por muito tempo. Afinal, disse: O que você tem?
Danny
abriu a boca para responder. O que ele tinha?
Benjy:
Eu perguntei o que você...
Já ouvi,
já ouvi.
O que
você tem?
Não
tenho nada, ok? Nada. E agora eu gostaria de fechar os olhos.
Benjy
inclinou-se mais perto dele. Em seu rosto, Danny viu compaixão misturada com
uma espécie
de curiosidade fria, que nunca se vê em adultos. Eles já aprenderam
a disfarçar isso.
Benjy:
Você não fica triste por não ter nada?
Não, não
fico.
Só que
ele estava triste. A tristeza baixou sobre Danny de repente e o soterrou. Ele
viu a si mesmo: estirado de costas no meio do nada, naquele fim de mundo, com a
cabeça esmagada. Um cara que não tinha nada.
Benjy:
Está chorando?
Danny: Você
deve estar de brincadeira com a minha cara.
Estou
vendo lágrimas.
É só por
causa do... minha cabeça está doendo. Você está fazendo ela doer.
Os adultos
às vezes choram. Vi mamãe chorar.
Preciso
dormir.
Benjy
olhou bem para ele. Danny fechou os olhos, ouviu a criança respirando bem perto
de seu ouvido.
Benjy:
Você é um adulto?
(Trecho de "O Torreão", de Jennifer Egan (Intrínseca). Imagem do CreepypastaWiki AQUI)